quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Deixar a alma preguiçar


"Lugar do Prado" Silva Porto, 1892


"A manhã, com o céu todo purificado pela trovoada da véspera, e as terras reverdecidas e lavadas pelos chuviscos ligeiros. Oferecia uma doçura luminosa, fina, fresca, que tornava doce, como diz o velho Eurípedes ou o velho Sófocles, mover o corpo e deixar a alma preguiçar, sem pressa nem cuidados. A estrada não tinha sombra, mas o sol batia muito de leve, e roçava-nos com uma carícia quase alada. O vale parecia a Jacinto, que nunca ali passara, uma pintura da Escola Francesa do século XVIII, tão graciosamente nele ondulavam as terras verdes e com tanta paz e frescura corria o risonho Serpão, e tão afáveis e prometedores de fartura e contentamento alvejavam os casais nas verduras tenras! Os nossos cavalos caminhavam num passo pensativo, gozando também a paz da manhã adorável. E não sei, nunca soube, que plantazinhas silvestres escondidas espalhavam um delicado aroma, que eu tantas vezes sentira, naquele caminho, ao começar o Outono."

A cidade e as serras, Eça de Queiroz

2 comentários:

  1. José Rodrigues Cosme Franco20 de outubro de 2015 às 22:36

    As plantazinhas, de flor lilás, com salpicos brancos, e que libertam um aroma intenso, mais ainda quando são pisadas, são as "Menta Pullegium" ou Poejo, seu nome popular.
    Zé Rodrigues Cosme Franco

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    1. Muito obrigada pelo esclarecimento, a isto se chama integrar saberes!

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