quinta-feira, 16 de abril de 2015

Tolerância



Não podendo ignorar a importância e actualidade da discussão relativa à tolerância como atitude e princípio de acção, propõe-se a seguinte reflexão:

1. - O que devo ou posso tolerar? Se colocarmos o problema em torno desta questão, somos confrontados com o significado do verbo tolerar e encontramos em suportar um sinónimo, o que significa que a atitude tolerante não constitui um fim em si, mas um meio para algo, suportamos porque dá jeito, ou convém, ou pretendemos alcançar algo.

2. O segundo ponto de reflexão que propomos é o do território da Moral, ou seja das “vizinhanças”, dos costumes e do valor de verdade auto-atribuído a cada um. O termo pode parecer menor e com isso querermos afirmar inequivocamente a desvalorização do conceito de moral, não é esse o caminho pretendido. Mas sim o da clarificação da sua génese. As morais são territórios plurais gerados no desenvolvimento intrínseco de cada comunidade humana, sujeitos por isso aos diversos contextos de assimilação e aculturação, maioritariamente acríticas e limitando-se a “suportar” o vizinho, o que lhe está mais próximo, aquele que não incomoda e até tem algo em comum. As morais permanecem círculos particulares em que a comunicação acontece em momentos esporádicos de intersecção.

3. O fenómeno, a que chamamos aqui de “vizinhança” moral, dando continuidade à compreensão do acto de tolerar enquanto suportar, promove a atitude relativista de que tudo vale o mesmo, de que a verdade definida em cada “território de vizinhança” é tão válida quanto outra, ou seja, não existe ordem qualitativa moral. A existir ordem ou raking das morais esta define-se numericamente, portanto, é a quantidade, número de praticantes ou seguidores de determinado rito ou costume, que eleva esse costume à categoria de moral digna de ser seguida ou de orientadora de comportamentos.

4. A atitude tolerante que surge nestes círculos morais não é muito diferente do anteriormente definido como atitude suportante, ou seja, de modo totalmente acrítico consideram-se todos os comportamentos e acções como aceitáveis, isto porque a sobrevivência das morais depende do acto de suportar mútuo.

5. Será o acto de suportar suficiente para gerar atitudes de tolerância num mundo complexo em que os costumes e as morais já não são meramente vizinhas mas questionam directamente a nossa compreensão de humano?

6. Reconhecer o “outro”, admitir que tem rosto, corpo, sensações, desejos e aspirações, ou seja, reconhecer que existe plenamente como sujeito e que não constitui um mero objecto com o qual me defronto, confronto e suporto parece ser o caminho que a reflexão ética nos mostra. Esta atitude obriga a uma constante análise dos princípios que orientam a nossa acção e, na grande maioria das vezes, a reconhecer a dimensão da nossa “ignorância” diante do que é humano. No espaço amplo de definição de humano faz-se a tolerância, aceita-se ou nega-se, ponderando continuamente os limites da acção e não relativizando o permitido, mas antes, devolvendo a todos a humanidade ao reconhecer, com Terêncio, que “nada do que é humano me é estranho”.

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