Os exemplos de
currículos escolares desenvolvidos de modo integrado são vários,
em Portugal e no resto do mundo. Este modelo de organização
curricular e pedagógica define-se pela compreensão da existência e
experiência humanas enquanto contínuo sistémico que decorre
integrando tudo e todos. A existência deste modelo curricular, em
que por exemplo as disciplinas são mais ou menos abolidas, a divisão
de turmas é informal, os professores são partilhados e entendidos
como recurso global da escola, a arquitectura do espaço se presta à
comunicação e deambulação das pessoas sem preocupação maior de
espaços interditos, a metodologia de trabalho abraça o projecto, o
feedback é contínuo, a avaliação significa aprendizagem e os pais
são considerados parceiros educativos, dizíamos, a existência
deste modelo organizacional de currículo significa compreender a
educação e a formação como processo em que a escolha e o poder de
decidir são acções essenciais. Não porque as crianças e jovens
possam sozinhos escolher, mas porque a escolha e a responsabilidade a
esta associada são aspectos essenciais da vida do indivíduo e das
comunidades. Depois, porque, aprender envolve motivação, sabemos
que as escolhas pessoais e o envolvimento geram dinâmicas
intrínsecas de “apego” e vinculação absolutamente essenciais
para o comprometimento pessoal que a aprendizagem exige.
Sintetizando, a liberdade de escolha, e não o acaso ou o despotismo,
fizeram-nos humanos.
Tudo isto vem a
propósito da definição de “um currículo essencial”.
No Brasil a expressão
“cesta básica” surgiu referindo-se ao conjunto de alimentos
considerados essenciais para que as famílias se mantivessem sem
problemas de maior no que diz respeito à ingestão mínima de
proteínas, minerais etc. Em Portugal esta cesta chamar-se-ia “cabaz
essencial”.
Nas últimas semanas
soubemos que os alunos do 9º do ensino básico, com idades entre os
14 e os 17 anos, não irão durante este ano lectivo e os próximos,
ter acesso a conteúdos curriculares relativos à sexualidade,
nomeadamente esclarecimentos e informação sobre meios
contraceptivos em aulas de Ciências Naturais. Soubemos também que o
apoio por parte do MEC, nomeadamente financeiro, ao ensino artístico,
música incluída, estava seriamente em perigo. O que nos permite
voltar aos dois conceitos que orientam esta reflexão: essencial e
escolha.
O que significa,
curricularmente falando, escolher? As escolas públicas podem
escolher a sua estrutura curricular, podem apresentar variações na
oferta educativa? Podem orientar e definir os seus projectos
educativos de forma singular? Propondo percursos e caminhos
diferentes? Os pais e os alunos podem optar por percursos
curriculares “alternativos” e não exclusivamente pelos
uniformizados?
Por último, como pode
qualquer autoridade definir o que é essencial? A música não é
essencial? Porquê? Não possui valor económico? Não podemos todos
ser músicos? Possibilitar a todos formação musical não é
essencial? Porquê? Podemos ser nós, cada um de nós, pais, mães,
crianças e jovens a definir o nosso “essencial”? Poderemos
entender que a essência do humano se faz pela escolha? Que a
natureza humana é o que é porque não está fundamentalmente
submetida a condicionalismos naturais mas possui uma extraordinária
essência cultural que a faz fazer coisas e produzir, tantas vezes,
inutilidades belas e autênticas, exactamente por isso, porque não
servem para nada, mas são essenciais, como a música.
E pensar que qualquer outra arte e ofício almeja reproduzir o sublime efeito da música no espírito.
ResponderEliminarDe resto, a simples exclusão de qualquer actividade criativa e do exercício da arte é suspeita. Porquê cortar essa veia? Pela falta de recursos? Para desencorajar o acesso a outras formas de expressão?
O sublime efeito da arte no espírito ou o sublime efeito do espírito na arte?
Eliminar